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40 anos após o fim da Ditadura, o Estado brasileiro não pode seguir sustentando assassinos e torturadores

O sucesso do filme “Ainda Estou Aqui”, que trouxe o primeiro Oscar para o brasil, vencendo na categoria de Melhor Filme Internacional há cerca de uma semana, além de resgatar os horrores da Ditadura Civil-Militar (1964-1985), através do caso da prisão e desaparecimento (e hoje sabemos, assassinato) do deputado Rubens Paiva e da luta de sua esposa Eunice por justiça, trouxe à tona uma questão até então pouco discutida, o pagamento de salários e pensões a militares envolvidos em crimes durante o período da Ditadura.

Só no caso dos cinco militares acusados de envolvimento no assassinato de Rubens Paiva, para se ter uma ideia, o Estado brasileiro gasta em torno de R$ 140 mil reais por ano, entre o pagamento de pensões para as famílias dos que já faleceram, e a aposentadoria dos que continuam vivos, no caso o major da reserva Jacy Ochsendorf, que recebe um salário bruto de R$ 23,4 mil reais mensais, e o general reformado José Antônio Belham, cuja aposentadoria é de R$ 35,9 mil brutos, por mês. Independentemente dos valores pagos, é um escárnio que um Estado que se diz minimamente democrático gaste um centavo sequer com o sustento de agentes de uma Ditadura que não apenas rompeu com a legalidade, mas subverteu todo e qualquer princípio de direitos e de dignidade humana durante longos 21 anos, tudo a serviço de uma política de superexploração dos trabalhadores.

Infelizmente, o Brasil mantém uma relação mal resolvida com o seu passado de autoritarismos, sobretudo com o mais recente, encerrado oficialmente em 15 de março de 1985. A chamada Lei da Anistia, aprovada em 1979, apesar de ter revogado as prisões e exílios forçados pela Ditadura aos que lutaram contra o arbítrio, também serviu para manter impunes os militares e civis que cometeram o que muitos historiadores classificam como Terrorismo de Estado, com a utilização de toda a máquina pública (e da parceria com setores privados) para impor um regime de exceção, em que prisões arbitrárias, torturas físicias e psicológicas e assassinatos passaram a se tornar prática corrente, ainda que nunca admitidas pelas autoridades.

Atualmente, estão em pauta no Supremo Tribunal Federal (STF), ações que buscam rever a aplicação da Anistia para casos de homicídio e ocultação de cadáver, este último considerado crime permanente, além de um recurso do Ministério Público Federal (MPF) que pretende destravar os processos contra os cinco militares envolvidos no assassinato e desaparecimento de Rubens Paiva. Os casos em discussão, podem ser considerados de repercussão geral, o que possibilitaria que militares envolvidos em outros crimes também fossem finalmente julgados e punidos.

Na mesma linha, a deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL, RS), protocolou ainda em janeiro, um Projeto de Lei que propõe a suspensão do pagamento de salários e pensões a militares envolvidos em crimes contra a humanidade durante a Ditadura de 1964. O PL estabelece que, em caso de acusação do militar, os pagamentos sejam suspensos até que o processo seja efetivamente concluído. Caso seja inocentado, o militar terá os pagamentos retomados, inclusive com os valores retroativos, referentes ao período de suspensão. Hoje, os denunciados seguem recebendo a remuneração e os proventos, até que seja esgotada a última possibilidade de recurso, o que pode durar anos.

Tanto as revisões, ainda que parciais e tardias, da Lei da Anistia, quanto o Projeto que busca suspender o pagamento de salários e pensões a militares assassinos e torturadores, são passos importantes no caminho da reparação histórica que o Estado brasileiro deve, especialmente às vítimas da Ditadura e às suas famílias, mas em certo sentido, ao conjunto do povo brasileiro. Se hoje nos vemos novamente às voltas com tentativas de golpe, inclusive com a participação de militares de alta patente, é também porque não passamos totalmente a limpo o nosso passado recente e, como tem sido habitual em nossa história, preferimos “jogar a poeira para debaixo do tapete”. O problema é que com isso, também se joga para debaixo do tapete os corpos e a memória de centenas de homens e mulheres, jovens e trabalhadores, que deram as suas vidas por um país livre e justo para a maioria da população. No próximo sábado, completam-se 40 anos do fim formal da Ditadura Civil-Militar. Digo formal, porque infelizmente ainda restam fragmentos desse período sombrio que se não forem definitivamente eliminados, podem voltar a eclipsar a nossa pálida democracia. Mais do que nunca, chegou a hora de o Brasil deixar de sustentar financeira e politicamente os verdadeiros subversivos de 1964.

Redação enFoco

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1 Comentário:

  • Marisa

    Isso precisa acabar, além de beneficiar criminosos é injusto com os trabalhadores e trabalhadoras que lutam diariamente por um salário digno . Trabalhadores e trabalhadoras que ajudam a construir nosso país.
    Essa mamata vergonhosa precisa acabar urgente.
    É uma questão de justiça social.

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