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O Conto Inacabado: Vidas Interrompidas, Contas a Pagar

Os acidentes de trânsito representam um grave problema de saúde pública e um significativo entrave para a economia do Brasil. Ao longo de uma década, as internações hospitalares decorrentes desses eventos onerosos consumiram aproximadamente R$ 2,9 bilhões do Sistema Único de Saúde (SUS), resultando em uma média anual de R$ 290 milhões. Estima-se que o custo médio total por vítima, abrangendo desde o atendimento pré-hospitalar até a reabilitação pós-alta, alcance R$ 10.750.

O impacto econômico dos acidentes de trânsito vai além dos gastos diretos com saúde. A perda de produtividade, os danos materiais e os custos judiciais elevam a conta para a sociedade a cerca de R$ 12,8 bilhões anuais. Desse montante, 62% estão relacionados aos cuidados de saúde e à perda de produção decorrente de lesões ou óbitos.

A Previdência Social também arca com um peso considerável. Entre 2000 e 2012, foram desembolsados aproximadamente R$ 25,6 bilhões em benefícios relacionados a acidentes de trânsito, sendo R$ 10 bilhões em auxílios-doença e aposentadorias por invalidez, e R$ 15,6 bilhões em pensões por morte. Em 2012, os gastos atingiram R$ 12 bilhões, um aumento de 54% em relação ao ano anterior (R$ 7,8 bilhões), impulsionado principalmente pelo crescimento dos acidentes envolvendo motocicletas, especialmente na região Nordeste.

Em termos macroeconômicos, os acidentes de trânsito representam cerca de 5% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, o que equivale a aproximadamente R$ 295 bilhões por ano. Desse total, 2,4% correspondem a custos previdenciários, incluindo benefícios e a perda de arrecadação devido à interrupção das contribuições dos trabalhadores acidentados. Os principais benefícios previdenciários concedidos às vítimas incluem auxílio-doença (incapacidade temporária), aposentadoria por invalidez (incapacidade permanente), auxílio-acidente (redução da capacidade laboral) e pensão por morte (dependentes de vítimas fatais).

A gravidade do problema se reflete também nas altas taxas de mortalidade. Em 2019, a taxa nacional foi de 20,5 mortes por 100 mil habitantes, uma das mais elevadas da América Latina. Analisando por categoria de vítima, as taxas por 100 mil habitantes foram de 5,19 entre motociclistas, 4,97 entre pedestres, 5,02 entre ocupantes de automóveis e 0,67 entre ciclistas. Embora dados específicos sobre incapacidade sejam limitados, estudos indicam que 20% das vítimas que recebem alta hospitalar apresentam sequelas permanentes, e entre motociclistas envolvidos em acidentes relacionados ao álcool, 4% resultam em incapacidade permanente.

A distribuição de vítimas por faixa etária revela vulnerabilidades específicas. Em 2020, 96 crianças (0 a 14 anos) perderam a vida em acidentes de trânsito, sendo 54% como ocupantes de veículos, 22% por atropelamentos, 16% em motocicletas e 8% em bicicletas. Em 2021, foram registradas 11.172 internações nessa faixa etária, com 28% relacionadas a bicicletas, 26% a atropelamentos, 24% a ocupantes de veículos e 22% a motocicletas. Jovens adultos (20 a 29 anos) representam 6,75% das vítimas fatais (dados de 2017), com homens jovens sendo os mais afetados, frequentemente devido a comportamentos de risco como dirigir sob efeito de álcool e em alta velocidade. Idosos (60 anos ou mais) apresentam as maiores taxas de mortalidade proporcionalmente, com 41 óbitos por 100 mil habitantes (dados de 2004), sendo particularmente vulneráveis a atropelamentos.

O custo financeiro por Anos de Vida Perdidos (AVP) é um indicador crucial para dimensionar o impacto socioeconômico dos acidentes de trânsito. Os AVP medem a quantidade de anos de vida produtiva perdidos devido a mortes prematuras, considerando a expectativa de vida no Brasil (76 anos, IBGE) e a idade média das vítimas fatais (jovens adultos entre 20 e 29 anos). Estimando o valor econômico de um ano de vida com base no PIB per capita de aproximadamente R$ 46.000 (2023), o custo de cada AVP seria de R$ 46.000. Assim, o custo total por morte prematura seria de cerca de R$ 2,1 milhões (46 AVP x R$ 46.000).

Estudos corroboram essa magnitude. O IPEA estima que os acidentes de trânsito custam R$ 50 bilhões por ano ao Brasil, com as mortes representando cerca de 60% desse total (R$ 30 bilhões). A Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta que cada morte no trânsito no Brasil implica uma perda econômica de aproximadamente US$ 200.000 (cerca de R$ 1 milhão). O Banco Mundial, para países de renda média, estima que o custo social dos acidentes fatais varia entre 5% e 7% do PIB, o que para o Brasil (PIB de R$ 9 trilhões) representa de R$ 450 a R$ 630 bilhões por ano. Calculando o AVP agregado no Brasil, com cerca de 30.000 mortes anuais (dados pré-pandemia) e uma média de 40 AVP por vítima, totalizam-se 1,2 milhão de anos perdidos por ano, com um custo econômico total de R$ 55 bilhões (1,2 milhão x R$ 46.000). Em comparação internacional, o custo por morte nos EUA é de US$ 1,5 milhão (NHTSA) e na União Europeia de € 1,4 milhão (ETSC), enquanto no Brasil varia entre R$ 1 milhão e R$ 2,1 milhões (equivalente a US$ 200.000 a 400.000).

Em conclusão, o custo financeiro dos anos de vida perdidos em acidentes de trânsito no Brasil é estimado entre R$ 1 milhão e R$ 2,1 milhões por morte, totalizando cerca de R$ 30 a 55 bilhões por ano, o que corresponde a 0,5% a 1% do PIB. Esses números reforçam a urgência da implementação de políticas públicas eficazes para reduzir a mortalidade no trânsito, como a fiscalização rigorosa do consumo de álcool e da velocidade, a melhoria da infraestrutura viária e campanhas educativas de conscientização.

Em suma, os acidentes de trânsito no Brasil configuram uma complexa questão que transcende a esfera da saúde pública, representando um significativo desafio econômico. A maioria das vítimas está em idade economicamente ativa, gerando considerável perda de produtividade e arrecadação. A falta de integração entre as diversas bases de dados dificulta a formulação de políticas públicas mais assertivas. Investir em prevenção, educação para o trânsito e infraestrutura segura é fundamental para mitigar os custos humanos e econômicos dessas tragédias.

Redação enFoco

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