É comum ouvirmos que idosos têm dificuldade para lidar com tecnologias, mas você já parou para pensar nos riscos do uso excessivo de telas entre pessoas dessa faixa etária? O que antes era um obstáculo tem se tornado, para muitos, um hábito e, em alguns casos, um vício.
Entre 2022 e 2023, o uso da internet cresceu mais entre brasileiros com mais de 60 anos. De acordo com a pesquisa PNAD Contínua – Tecnologia da Informação e Comunicação (PNAD TIC 2023), divulgada pelo IBGE, o percentual de idosos conectados saltou de 62,1% para 66% no período. Esse avanço de 3,9 pontos percentuais foi o maior entre todas as oito faixas etárias analisadas.
Embora o uso da internet ainda seja mais massivo entre os mais jovens, com 96,3% de adesão entre pessoas de 25 a 29 anos, o crescimento entre os mais velhos chama atenção por revelar uma tendência de digitalização acelerada também na terceira idade. A psicopedagoga Janice Bertoldo, que atua com educação digital para a terceira idade, destaca que essa é uma preocupação crescente. “Assim como em outras faixas etárias, o uso prolongado de telas por idosos pode se tornar uma dependência comportamental, especialmente quando a tecnologia passa a substituir outras atividades e interações sociais importantes”, afirma.
Segundo Janice, as manifestações do uso excessivo de telas em idosos podem se apresentar em dimensões físicas, mentais e sociais. Entre os sinais de alerta, destacam-se o isolamento social, alterações de humor como irritabilidade ou ansiedade ao se afastar do celular, problemas físicos relacionados à insônia ou dores no pescoço, negligência de rotinas, além da vulnerabilidade digital, isto é, o maior risco de cair em golpes, consumo de desinformação e desenvolvimento de ansiedade provocada por notícias falsas ou alarmistas.
Uma questão emocional e social
De acordo com a especialista, muitos idosos enfrentam perdas significativas com o avanço da idade, seja de entes queridos, da mobilidade, da rotina social ou do propósito ligado ao trabalho. Nesse cenário, o celular se torna uma ferramenta acessível e conveniente para preencher vazios emocionais.
“O uso constante de telas apresenta um duplo impacto nos vínculos afetivos reais. Por um lado, pode promover a conexão, mas, por outro, o uso excessivo e inadequado, pode prejudicá-los, substituindo ou enfraquecendo as interações presenciais”, afirma Janice.
Entre as consequências emocionais mais frequentes estão a solidão, ansiedade, irritabilidade, queda da autoestima e até o desenvolvimento da nomofobia, o medo irracional de ficar sem o celular. Diante disso, identificar os sinais é o primeiro passo. O segundo é agir com empatia e diálogo. Segundo Janice, algumas estratégias eficazes incluem conversas abertas e acolhedoras, sem julgamentos e o estabelecimento de limites saudáveis, como períodos livres de tela. Ainda, estimular atividades offline que promovam prazer, movimento e conexão, e ajuda profissional, em casos mais graves.
Janice Bertoldo ressalta que o objetivo não é excluir a tecnologia da rotina do idoso, mas garantir que ela seja usada com consciência.
“As telas não devem substituir os vínculos afetivos, mas sim atuar como um complemento para mantê-los vivos e até para criar novas conexões”.
Ao incentivar essas práticas, é essencial respeitar os interesses e os limites de cada idoso. Dessa forma, é possível promover prazer, autonomia e propósito. O trabalho psicopedagógico com idosos no contexto tecnológico é fundamental para promover a inclusão digital, combater o isolamento social e proporcionar uma melhor qualidade de vida nessa fase da vida.
Mais do que ensinar o uso de ferramentas digitais, trata-se de construir pontes entre gerações, fortalecer vínculos afetivos e garantir que a tecnologia seja uma aliada no caminho para um envelhecimento mais saudável.
Por: Mariana Rodrigues