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A moda que o planeta não veste mais: o custo ambiental do consumo por impulso

Um reel da Tais Lima (@taislimalifestyle) que vi esta semana me cutucou de um jeito diferente. A gravação mostrava montanhas de roupas descartadas no Deserto do Atacama: peças novas, com etiqueta e surgia a frase: “produção em massa, consumo em massa… descarte em massa. Mas o planeta não aguenta mais esse ritmo”. Aquilo me fez pensar: será que nos perguntamos para onde vão as roupas que não usamos mais? E, mais ainda, será que alguém, em algum lugar, está vestindo aquilo que deixamos para trás?

Essa reflexão me inspirou a escrever sobre a moda e o meio ambiente e por que nosso consumo precisa virar assunto coletivo. Porque o exemplo de Atacama é impressionante: estima-se que existam roupas suficientes produzidas globalmente para vestir pelo menos seis gerações futuras. E, ainda assim, continuamos a produzir em massa. Isso representa um desperdício colossal, tanto de recursos naturais quanto de potencial de solidariedade.

O caso do Deserto do Atacama não é isolado. Todos os anos, cerca de 39 mil toneladas de roupas são descartadas ali, de acordo com reportagens recentes. Peças que poderiam ser doadas, reutilizadas, transformadas. Mas que acabam soterradas no solo seco de um dos lugares mais áridos do planeta, poluindo a terra e, principalmente, escancarando a lógica perversa da indústria da moda.

Vivemos na era do fast fashion, uma engrenagem que produz roupas em alta velocidade e a baixo custo para atender a uma demanda criada artificialmente. Estações cada vez mais curtas, coleções lançadas semanalmente, peças que se tornam “descartáveis” depois de duas ou três lavagens. E nós, consumidores, muitas vezes compramos sem pensar. Porque estava barato. Porque era tendência. Porque a vitrine era convidativa.

Mas a conta chega. Para o planeta, ela já está vencida.

A produção têxtil é uma das indústrias mais poluentes do mundo. Estima-se que ela consome cerca de 93 bilhões de metros cúbicos de água por ano, o suficiente para abastecer 5 milhões de pessoas. Além disso, 20% da poluição da água industrial vem do tingimento de tecidos, e milhares de microfibras sintéticas são liberadas nos rios e oceanos a cada ciclo de lavagem, correspondendo a metade de todo o microplástico marinho.

Isso sem falar no descarte. No Brasil, mais de 170 mil toneladas de resíduos têxteis vão para os lixões e aterros sanitários todos os anos. E a maior parte deles é feita de fibras que não se decompõem facilmente — como o poliéster, derivado do petróleo. Ou seja: o que descartamos hoje pode continuar no planeta por décadas, contaminando o solo, a água e a vida.

Por isso, é urgente repensar esse ciclo.

Repensar o consumo começa com consciência. Antes de comprar, podemos nos perguntar: “Eu realmente preciso disso?” “Essa peça combina com o que eu já tenho?” “De onde ela vem? Quem a fez? Em que condições?” Essas perguntas podem parecer simples, mas têm um poder transformador.

Depois vem o reaproveitamento. Roupa parada no armário pode ganhar novo uso, seja com ajustes, customizações, ou doações para quem precisa. Brechós, bazares e grupos de troca também são formas incríveis de dar vida nova a peças que, de outro modo, estariam condenadas ao esquecimento (ou ao lixão).

E precisamos, sim, cobrar as marcas. Exigir transparência, compromisso ambiental e logística reversa — que ainda é rara no setor têxtil brasileiro. A responsabilidade não é só nossa, consumidores; é também de quem produz e lucra com esse modelo acelerado de consumo.

A economia circular precisa deixar de ser discurso e se tornar prática. Produzir menos, com mais qualidade e durabilidade. Reutilizar materiais. Reduzir resíduos. Valorizar o trabalho digno de quem está por trás das costuras. E, acima de tudo, romper com a ideia de que a moda precisa ser descartável para ser atual.

Não se trata de criminalizar quem gosta de se vestir bem. Moda é expressão, é cultura, é identidade. Mas ela precisa ser também sustentável. Precisa respeitar o tempo da natureza, o trabalho das pessoas e os limites do planeta.

Aquela imagem do Deserto do Atacama é um retrato do que não vemos: o lixo invisível do nosso consumo impensado. E, ao mesmo tempo, é um chamado. Para repensar. Para agir. Para costurar novos caminhos, com mais propósito, mais responsabilidade e menos desperdício.

Talvez não seja possível mudar tudo de uma vez. Mas cada escolha importa. Cada peça reaproveitada, cada compra consciente, cada atitude crítica diante da vitrine… tudo isso já é parte da mudança.

Porque, no fim das contas, a moda que o planeta precisa vestir… é aquela que não destrói o próprio mundo.

Redação enFoco

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