A simples desconfiança de um professor que o aluno usou inteligência artificial para realizar as suas atividades, está afetando as relações dentro da sala de aula, entre professores e alunos. Muito se tem discutido sobre os impactos da IA generativa no ensino superior. Mas, apesar de haver um número cada vez maior de pesquisas sobre esse tema, um grupo essencial ainda tem sido pouco ouvido nessas conversas, justamente o mais apto a falar sobre o assunto: os estudantes. Em recente pesquisa da Universidade de Pittsburgh, nos Estados Unidos, com noventa e cinco alunos, detectou que, mesmo quando nem professores nem alunos fazem uso da IA, a tecnologia já está afetando significativamente as relações interpessoais, a aprendizagem e, principalmente, a confiança dentro da sala de aula, ou seja, a IA apenas corroborou. As ferramentas como ChatGPT, Gemini e Claude estão, sim, mudando a forma como os alunos estudam. Mas mais do que isso: estão transformando as dinâmicas com professores – e também entre os próprios colegas. Na pesquisa identificou-se que a maioria dos participantes contou já ter recorrido à inteligência artificial, principalmente quando estavam perto da data de entrega, quando viam a tarefa como “sem sentido” ou simplesmente ficavam travados diante das dificuldades. Eles nem sempre começam os trabalhos com IA, mas acabam usando em algum momento. Outro ponto a ser destacado é que alguns respondentes chegaram a dizer que preferem usar inteligência artificial a pedir ajuda a professores, tutores ou monitores, conversar com um chatbot é menos intimidador do que marcar um horário com o professor que, às vezes, pode parecer distante ou até “arrogante”. Em contra ponto, muitos também disseram sentir culpa ou vergonha por usá-la, seja por questões éticas, ambientais ou por medo de parecerem preguiçosos. A falta de clareza sobre o que pode ou não ser usado é um inibidor. Em trabalhos em grupo, o uso de inteligência artificial chega a ser visto como “um grande sinal de alerta”, fazendo com que alguns percam até o respeito entre os colegas. Essa desconfiança tem se espalhado pelas relações, tanto entre alunos e professores quanto entre os próprios alunos. Muitos têm receio de ficar para trás caso outros estejam usando IA para tirar notas melhores. Isso acaba criando um distanciamento emocional e um clima de cautela entre colegas. Especula-se que só a suspeita de que alguém usou IA já é suficiente para abalar a confiança em sala de aula. Os alunos têm tanto medo de serem acusados injustamente quanto de serem descobertos caso, de fato, usem a tecnologia. Sabemos que a conexão entre professores e alunos é essencial para o aprendizado, assim como os laços entre os próprios colegas. Se os estudantes estão evitando conversar com professores ou deixando de trocar experiências com seus pares por insegurança diante de regras confusas ou que mudam o tempo todo sobre o uso da IA generativa no ensino superior, as universidades precisam buscar novas formas de fortalecer essas relações. As aulas presenciais, por exemplo, podem ser uma boa oportunidade para valorizar os encontros cara a cara. Professores podem incentivar os alunos a comparecer mais aos horários de atendimento. Iniciativas como projetos de pesquisa, programas de mentoria ou eventos informais também podem fazer a diferença. Ressalto que em vez de vê-los como “trapaceiros”, é preciso reconhecer a complexidade dessa situação. Muitos estão tentando lidar com uma nova realidade, sem regras claras e com pouco suporte.
Prof. Mateus Frozza
Economista. Professor Universitário.