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Entre herança e legado: o que realmente quero deixar aos meus filhos

Por Eizzi Benites Melgarejo – advogada OAB/RS 86.686 – sócia do escritório Urach, Jensen, Abaide, Melgarejo e Brum

Esses dias vivi uma situação que me fez pensar sobre o verdadeiro significado de construir algo para o futuro. Descobri que meu filho de 13 anos havia gasto mais de três mil reais no nosso cartão de crédito comprando moedas em um jogo online. Três mil reais! O equivalente a dias inteiros de trabalho, horas de estudo, noites mal dormidas, audiências, clientes, prazos, responsabilidade. O valor em si era o de menos. O que me impactou foi perceber que ele não fazia ideia do que aquele dinheiro representava.

Naquele momento, entendi que, enquanto eu me preocupava em deixar um patrimônio, não estava ensinando o valor da construção. Eu vinha preparando uma herança, mas não um legado.

Herança é aquilo que se transmite por bens, contas, imóveis, participações. É o resultado tangível de uma vida de esforço. Mas o legado é o que se transmite por consciência e é o que, de fato, mantém o patrimônio vivo. Quantos herdeiros recebem fortunas e, poucos anos depois, já não têm mais nada? Quantas famílias se perdem em litígios por falta de diálogo, de planejamento, de clareza? Quantas empresas familiares são destruídas na segunda geração simplesmente porque ninguém ensinou os herdeiros a administrar o que receberam?

E foi então que percebi que proteger o patrimônio é muito mais do que acumular. É educar. É ensinar a tomar decisões com responsabilidade, com base em conhecimento, inclusive jurídico. Assim como ensinamos a escovar os dentes, atravessar a rua, calcular o troco ou respeitar o outro, deveríamos ensinar a buscar orientação antes de agir, a pensar nas consequências legais e financeiras de cada escolha.

Prevenir é também proteger. Planejar é também amar.

Mas a nossa geração, de forma geral, ainda enxerga o jurídico apenas como remédio, e não como vacina. Crescemos com a mentalidade de resolver problemas, não de evitá-los. É por isso que tantos contratos são assinados sem análise, tantas sociedades são formadas por impulso, tantos bens são registrados de forma equivocada. E é por isso que tantos pais, mesmo os mais bem-intencionados , deixam heranças desorganizadas, que se transformam em verdadeiros campos de batalha.

O planejamento jurídico e patrimonial não é assunto apenas de grandes fortunas. Ele começa dentro de casa, quando se fala sobre dinheiro sem culpa, quando se explica o que é o trabalho, o valor do tempo, o custo de viver. Começa quando um pai ou uma mãe decide que o melhor exemplo que pode deixar é a consciência.

Legado é ensinar que prosperidade e ética não se excluem. Que o sucesso não é sujo. Que ambição não é pecado. Que abundância é consequência de responsabilidade e propósito. É mostrar que o dinheiro, quando bem administrado e juridicamente protegido, é instrumento de liberdade, não de aprisionamento.

Por isso, hoje compreendo que meu papel como mãe e como advogada se encontra num mesmo ponto: educar para a construção. Ensinar que todo patrimônio precisa ser pensado, planejado e protegido; que o apoio jurídico deve fazer parte das decisões mais simples da vida: abrir uma empresa, comprar um imóvel, fazer uma parceria, assinar um contrato. Tudo isso é prevenção. Tudo isso é herança de valor.

Porque um dia, meus filhos talvez herdem o que eu tenho. Mas o que eu realmente quero é que perpetuem o que eu sei. Que entendam que o que sustenta uma herança é o legado: o exemplo de trabalho, a consciência de valor e a sabedoria de se cercar de boas orientações, inclusive jurídicas.

Herança é o que se deixa.
Legado é o que se constrói, é o que se perpetua.
E é nele que está o verdadeiro sentido de proteger quem amamos.

Reinaldo Guidolin

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