Neste mês, celebramos o “Julho das Pretas”, iniciativa que busca ampliar a visibilidade para a luta antirracista, e pela promoção de políticas públicas que visam combater as desigualdades raciais e de gênero. Criada pelo Odara – Instituto da Mulher Negra, em 2013, a ação surgiu como uma forma de ampliar a visibilidade da já tradicional data de 25 julho, instituído pela ONU em 1992, como Dia Internacional da Mulher Negra, Latino-americana e Caribenha e, desde 2014,marcado no Brasil também como o Dia de Tereza de Benguela, importante liderança negra e feminina no combate à escravidão.
As mulheres negras são, hoje, o maior setor da população brasileira. De acordo com dados contidos no relatório anual do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, o PNUD, nós somos mais de 60 milhões, e representamos 28,5% do total da população do país. Ainda assim, os números também revelam a situação de vulnerabilidade a que muitas de nós continuam expostas. A renda das mulheres negras representa apenas 16% do rendimento total do Brasil, o que significa que nós somos a parcela mais mal remunerada da classe trabalhadora.
Como se não bastasse ocuparmos, via de regra, os piores postos do mercado de trabalho, grande parte de nós sequer sequer consegue uma ocupação, seja pelo déficit de qualificação profissional, seja por exemplo, pelo fato de que 31,8% das mulheres negras brasileiras não trabalham por estarem envolvidas com os cuidados dos filhos ou outros familiares. Ao todo, 48% de nós estão fora do mercado formal de trabalho, segundo o Instituto de Pesquisa Aplicada (Ipea).
Hoje, o nosso é o único mandato preto da Câmara de Vereadores de Santa Maria, fato que para nós representa uma conquista, mas que ao mesmo tempo denuncia o quanto ainda temos que avançar em termos de representação política e luta por igualdade. Isso, porque infelizmente, nós sabemos que dificilmente outros parlamentares, por mais solidários que sejam com a luta antirracista, serão capazes de levar adiante pautas que são tão caras e urgentes para o nosso povo. Isso aumenta a nossa responsabilidade, e tem nos inspirado na elaboração de projetos que ajudem a mudar o curso da história de muitas pessoas negras, especialmente
mulheres, que via de regra, é atravessada pelo preconceito e pela falta de oportunidades.
Um desses projetos, é o Projeto “Infância Sem Racismo” (PL 9972/2025), que prevê um conjunto de ações articuladas entre o Poder Público, a comunidade escolar e as famílias, para o combate ao racismo na infância, principalmente através da educação para a equidade racial. Na mesma linha, também protocolamos o PL 9953/2025, que institui um Programa de Capacitação dos profissionais da educação municipal para a promoção da igualdade racial, com formações anuais.
Também elaboramos um Projeto que prevê a criação de uma Política Municipal de Enfrentamento ao Racismo na Segurança Pública de Santa Maria, com ações de conscientização, capacitação e acompanhamento contínuo dos profissionais da segurança do Município.
Pensando justamente nos desafios que muitas mulheres negras ainda enfrentam para o acesso ao mercado de trabalho de maneira digna, protocolamos também o Projeto de Lei nº 9964/2025, que institui o Selo de “Inclusão e Equidade para Mulheres Negras no Mercado de Trabalho” de Santa Maria. Em linhas gerais, esse Projeto busca incentivar as empresas e organizações públicas do Município de Santa Maria, a adotarem políticas e práticas voltadas à equidade étnico-racial e de gênero em seu quadro de funcionários.Isso significa não apenas o incentivo à contratação de mulheres negras, o que por si só já seria importante, mas o estímulo à criação por parte dos estabelecimentos públicos ou privados, de práticas que visem o combate à desigualdade nas relações de trabalho. Isso significa, por exemplo, o pagamento de uma remuneração justa e equivalente aos demais profissionais da área, e condições de permanência e ascensão profissional.
Sabemos que séculos de desigualdades não serão superados apenas com projetos locais, por mais importantes que sejam, mas temos a compreensão de que cada passo adiante no sentido de um futuro mais justo para as mulheres negras, vale muito a pena. Ao mesmo tempo, nossa luta tem uma perspectiva de combate estrutural ao racismo, ao machismo, o que significa entender que somente com a superação dessas estruturas de perpetuação dos privilégios de um punhado às custas da exploração e da opressão da maioria do povo. Neste “Julho das Pretas”, queremos colocar em discussão, na Câmara e nas ruas, uma agenda que enfrente de maneira corajosa e efetiva o racismo e as desigualdades de gênero.