Falar de meio ambiente costuma nos levar a imagens visíveis: rios transbordando, encostas desmoronando, florestas derrubadas. Mas há uma dimensão silenciosa, invisível aos olhos, que sustenta a vida e a economia de milhões de brasileiros: as águas subterrâneas. Sob nossos pés corre uma riqueza imensa, armazenada em aquíferos que garantem abastecimento humano, irrigação agrícola, indústrias e equilíbrio dos ecossistemas. Entre eles, o Aquífero Guarani, um dos maiores do mundo, estende-se por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai e sua maior porção está justamente no nosso território.
No entanto, a abundância aparente não deve nos iludir. Assim como os rios de superfície, essas reservas não são infinitas nem estão livres das pressões humanas. O crescimento urbano desordenado, a expansão da agropecuária e a ausência de planejamento transformaram os lençóis freáticos em depósitos de resíduos invisíveis. Postos de combustíveis com tanques corroídos, cemitérios sem estudos geotécnicos, redes clandestinas de esgoto, áreas industriais contaminadas, tudo isso infiltra-se lentamente no solo e alcança os aquíferos, comprometendo uma água que levará décadas ou séculos para se regenerar.
A poluição subterrânea é especialmente cruel porque não avisa. Diferente da espuma em um rio ou do mau cheiro de um córrego a céu aberto, ela se espalha de forma silenciosa. Quando chega às torneiras ou às irrigações, muitas vezes já é tarde demais: os custos para recuperar ou tratar são altíssimos, e os impactos na saúde pública tornam-se inevitáveis. É o risco invisível que compromete não só o presente, mas gerações futuras.
No caso do Aquífero Guarani, a responsabilidade é ainda maior. Estamos falando de uma reserva estratégica que poderia garantir segurança hídrica para o Cone Sul em tempos de crise climática. Estiagens prolongadas, cada vez mais frequentes, tornam essa água subterrânea um recurso vital. Porém, ao mesmo tempo em que ela poderia ser nosso seguro contra a escassez, sua contaminação representaria uma perda irreparável, não apenas ambiental, mas geopolítica.
O Brasil possui legislação para proteger essas áreas, como o Código Florestal e as Áreas de Preservação Permanente, que funcionam como zonas de recarga hídrica. No entanto, a realidade prática é outra: impermeabilização do solo nas cidades, supressão de vegetação nativa e falta de fiscalização comprometem justamente esses pontos de recarga. Sem mata, sem solo permeável, sem planejamento, não há aquífero que resista.
A questão nos leva a um dilema central: queremos continuar tratando a água apenas como recurso a ser explorado ou como patrimônio comum a ser preservado? O investimento em saneamento básico, monitoramento de poços, licenciamento ambiental rigoroso e reflorestamento de áreas de recarga não é luxo, é sobrevivência. Ao negligenciar o invisível, estamos hipotecando nosso futuro.
É urgente incluir as águas subterrâneas no debate público. Falamos muito dos rios que vemos transbordar, mas esquecemos que boa parte da água que bebemos, que irriga a comida que chega à mesa e que movimenta a economia vem debaixo da terra. O silêncio dessas águas não pode ser confundido com segurança. Pelo contrário, é um convite à vigilância.
O Aquífero Guarani e tantos outros lençóis freáticos não gritam. Eles apenas registram, lentamente, nossas escolhas. Cabe a nós decidir se vamos deixar para as próximas gerações um manancial preservado ou um passivo ambiental invisível e irreversível.
No fim, proteger o que não se vê é o maior teste da nossa responsabilidade coletiva. Porque, em se tratando da água subterrânea, quando a poluição se torna visível, já é tarde demais.
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