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Saneamento básico: a infraestrutura invisível que sustenta uma cidade saudável

Se existe um tema que permanece invisível aos olhos da maioria, mas que impacta diretamente a saúde pública, o meio ambiente e a qualidade de vida nas cidades, esse tema é o saneamento básico. E ainda que ele raramente ocupe manchetes ou discursos populares, sua ausência é facilmente notada: seja pelo mau cheiro vindo de fossas, pelo lixo acumulado em valas, ou pelas águas de arroios e rios transformadas em canais de esgoto a céu aberto.

Quando uma cidade não trata adequadamente seus resíduos líquidos — ou sequer coleta o esgoto gerado nas residências — o resultado é uma cadeia de contaminações. O esgoto doméstico sem tratamento carrega fezes, urina, resíduos alimentares, produtos de limpeza e outras substâncias que, ao serem lançadas diretamente no solo ou nos cursos d’água, provocam a degradação de todo o ecossistema ao redor. Isso significa menos água limpa, menos biodiversidade, mais proliferação de doenças e mais prejuízo aos cofres públicos com tratamentos de saúde e obras emergenciais.

Além disso, o solo contaminado por infiltrações de esgoto perde sua capacidade de absorção e filtragem, comprometendo lençóis freáticos, nascentes e a própria estabilidade das áreas urbanas, que se tornam mais vulneráveis a deslizamentos e erosões em períodos de chuva intensa.

Em Santa Maria, a cobertura por rede de esgoto ainda não atende toda a população. Estima-se que cerca de 77% das residências estejam ou estarão ligadas ao sistema até o final de 2025 — um avanço importante, mas ainda distante da meta nacional prevista pelo Marco Legal do Saneamento, que estabelece a universalização da coleta e tratamento até 2033. Atualmente, estão em andamento obras em cinco bairros: João Goulart, Km 3, Nossa Senhora das Dores, Caturrita e Diácono João Luiz Pozzobom. Juntas, essas frentes devem beneficiar mais de 10 mil pessoas.

Mas o desafio não é apenas local. No Brasil, cerca de 100 milhões de pessoas ainda vivem sem acesso à rede de esgoto, e apenas 51,2% de todo o esgoto gerado é tratado, segundo o Painel de Saneamento Brasil (2023). No Rio Grande do Sul, o índice de tratamento é um pouco superior, mas ainda preocupante: apenas 37% dos municípios gaúchos possuem sistemas de esgotamento sanitário com algum nível de tratamento, e em muitos deles o serviço não cobre a totalidade da área urbana.

Apesar das obras em andamento, ainda existem inúmeras áreas em que os dejetos são lançados em fossas rudimentares ou direcionados clandestinamente para redes pluviais. Quando isso ocorre, o esgoto percorre ruas e margens de arroios e córregos da cidade, causando contaminação direta de áreas públicas e até de terrenos residenciais. O resultado? Riscos de surtos de hepatite A, leptospirose, giardíase, verminoses e outras doenças silenciosas, que continuam presentes em regiões desassistidas.

É importante lembrar que saneamento básico não se limita à rede de esgoto: ele inclui também drenagem urbana, abastecimento de água potável e manejo adequado de resíduos sólidos. Todos esses sistemas estão interligados — quando um falha, os demais são pressionados. O lixo mal descartado, por exemplo, entope bocas de lobo e contribui para alagamentos, enquanto o esgoto não tratado acelera a degradação dos mananciais usados para abastecer a população.

Mais do que um serviço técnico, o saneamento básico é um direito humano. E um dever coletivo. Ele exige investimento, planejamento, continuidade, transparência — e, sobretudo, vigilância social. Cabe ao poder público cumprir seu papel, mas cabe também à população acompanhar, cobrar e compreender a importância dessa infraestrutura que, mesmo longe dos olhos, está no centro da vida urbana.

Santa Maria dá passos na direção de uma cidade mais saneada. Mas o desafio é muito maior do que a construção de redes. O desafio é cultural, institucional e educativo. E passa por reconhecer que nenhum plano ambiental, nenhuma meta de sustentabilidade e nenhum futuro saudável será possível sem esgoto tratado, água limpa e solo protegido.

Redação enFoco

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